domingo, 28 de março de 2010

Música do outro lado do mundo


Uma das coisas mais legais de se passar um tempo do outro lado do mundo é ter contato com coisas das mais bacanas que, do contrário, você nunca iria descobrir. Mesmo em um país minúsculo como a Nova Zelândia, com pouco mais de quatro milhões de habitantes, onde a indústria cultural não é das mais movimentadas, você sempre volta com algo a mais na bagagem além das lembrancinhas para amigos e parentes.

No meu caso, duas coisas ficaram na minha memória (e ouvidos). A primeira é como os neozelandeses têm bom gosto musical. Não tinha uma loja que eu entrava que não tinha uma música legal tocando. O mesmo para os pubs e Cafés. Eram os sucessos do momento e muita coisa antiga. E eu nunca vou esquecer da cena dos pedreiros que trabalhavam ao lado da pensão que eu morava ouvindo Guns'n Roses. Isso mesmo, pedreiros trabalhando ao som de Sweet Child O'Mine. Sentiu a diferença?

A segunda coisa que ficou mais no ouvido do que especificamente na memória é a neozelandesa Ladyhawke. Daqueles exemplos típicos de cantoras que sabem fazer música basicamente pop, mas com relevância. Especialmente se você pegar as músicas de trabalho como Magic e My Delirium. Sabe a outra Lady, a Gaga? Então, a Hawke é uma Lady com mais conteúdo, digamos assim (e sem o fetiche bizarro de roupas espalhafatosas, claro).

Agora, o resto do albúm a difere completamente. Músicas como Better Than Sunday, Love Don't Live Here e Dusk Till Dawn tem aquela inconfundível batida eletro pop que fez sucesso nos anos 80. Por isso mesmo são deliciosamente viciantes. Já as Paris is Burning e Manipulating Woman têm letras divertidas e sarcásticas. Tudo feito bem ao estilo da Nova Zelândia: descompromissado, mas com qualidade.

Uma amostra:


segunda-feira, 22 de março de 2010

Felicity - Freshman Year


Ela tinha a vida toda planejada pela frente. Iria para a mesma Universidade que o pai estudou, depois iria cursar Medicina e ter a profissão que ela e seus pais tanto desejevam. Mas, em plena cerimônia de formatura, as coisas mudam completamente. Felicity vê o rapaz que sempre foi apaixonada no gramado e pede que ele escreva algo no seu yearbook. Ele demora um tanto mais do que o normal. Felicity finalmente lê o que Ben escreve e, para sua total supresa, percebe que não era completamente invsível a ele como havia imaginado. Em um súbito de coragem, Felicity pergunta a Ben em qual cidade iria estudar. "New York", ele responde. É o suficiente para que Felicity resolva mudar todos seus planos e ir para a mesma cidade que o rapaz, apesar de todos os protestos de seu pai.

Esses são os oito minutos iniciais do episódio piloto de Felicity, uma das minhas séries preferidas de todos os tempos. Criada por J.J Abrams (que anos mais tarde se tornaria o midas do entretenimento, com o lançamento de Lost e a direção e recriação de Star Trek) junto com o seu parceiro de criação Matt Reeves (que depois dirigiria aquela coisa bacana do Cloverfield), o seriado teve relativo sucesso em 1998 e rendeu até um Globo de Ouro de melhor atriz para a protagonista, Keri Russel. Mas, as outras temporadas não tiveram o mesmo êxito, e a série acabou sendo cancelada na sua quarta temporada, o que cobria o período de faculdade da Felicity (por isso, os DVD's são divididos em freshman, sophomore, junior e senior).

O que eu mais gostava na história era justamente os momentos como o do início dessa temporada: atitudes que tomamos e que nem sempre dão muito certo. Isso porque Felicity é um seriado de personagens dos mais humanos e verossímeis que eu já assisti, em especial a protagonista. Impossível não se identificar com todo o sofrimento com a adaptação de Felicity a toda essa nova vida, a sua constante dúvida se essa foi ou não uma decisão válida, a sua decepção com o Ben real em detrimento ao que ela havia imaginado. Fora aquelas aitudes que temos e que não temos idéia do por quê (quando, por exemplo, Felicity resolve reescrever um trabalho de Ben, ou quando tem a sua primeira experiência sexual com um cara que mal conhece).

Personagens completamente seguros de si e totalmente conscientes do que fazem existem aos montes em seriados por aí. Mas, esse tipo de coisa não me atrai muito. Prefiro ver coisas na TV que poderiam muito bem ter acontecido com alguém que eu conheço. Sabe, gente com defeitos? E Felicity é exatamente assim.

Os diálogos são sempre simples, sinceros, mas não deixam de ser profundos (e só prova como J.J Abrams e seus colaboradores são roteiristas completos, que podem fazer de ficção-científica-maluca a seriado girly com a mesma qualidade). Além disso, a trilha sonora é sempre de bom gosto e a fotografia é simplesmente única.

Infelizmente, as caixas com os DVD's não foram lançadas no Brasil (e provavelmente nunca irão ser). Mesmo assim, mal posso esperar pra importar os próximos anos e ter a coleção completa.

Uma amostra do piloto:


terça-feira, 16 de março de 2010

Cat Power - Juke Box

Eu só queria escrever isso:"faça um favor a você mesmo e escute esse CD". Mas eu achei que eu deveria ser um tanto mais persuasivo com os meus...errr...sete leitores. Então, vamos lá:

Cat Power. Não reconhece o nome? Foi o que a cantora americana Chan Marshall usou como pseudônimo durante toda a sua carreira. Filha de pianista, ainda quase adolescente mudou-se para Nova Iorque para tentar a sorte com a música. Conseguiu um contrato em 1995, depois de abrir shows de outra americana. Liz Phair. Desse tempo pra cá, lançou oito albúns (sendo dois deles coletâneas de covers), se envolveu em uma série de problemas de saúde mental e física (já teve depressão profunda e alcoolismo) e até mesmo de aceitação (quase desiste de tudo para virar...babá!).

Pessoalmente, não gosto muito da Chan do começo de carreira. Aliás, demorou até que ela se tornasse uma das minhas cantoras favoritas. O fato é que Cat Power dos Dear Sir, Myra Lee, What Would the Community Think é indie demais para o meu gosto. É basicamente Chan, uma guitarra e sua voz inconfundivelmente rouca susurrando suas dores para o mundo. E só. Já o som do You Are Free é um pouco mais elaborado e menos restrito ao pessoal underground apreciador de músicas estranhas. Mas é The Greatest o grande divisor de águas na carreira da cantora. Com a adição de uma banda excepcional, e uma pegada mais para o soul, Cat Power cai nas graças da crítica e, pela primeira vez, do público. Depois disso, seguiu-se o básico de quem consegue um pouco de fama: fez ponta em um filme (My Blueberry Nights, em que Norah Jones é a protagonista) e músicas em trilhas sonoras (Juno fez toda menina chorar quase no final do filme, com a Sea of Love).

Entretanto, o que Chan Marshall faz de melhor mesmo é covers. De forma tal que quase supera as originais. Prova disso é o The Jukebox, album de regravações lançado em 2008. Vá direto para a segunda faixa e se supreenda com a New York da Chan. Irreconhecível e sensacional. Ramblin (Wo)Man é melhor, mas muito melhor do que Ramblin' Man, dos Allman Brothers. O conjunto voz-piano-bateria-guitarras-distorcidas fazem Metal Heart a melhor do CD. Aretha, Sing One For Me fica irresistível na versão Cat Power. E, de quebra, Chan declara todo o seu amor a Bob Dylan em Song to Bobby.

Obrigatório. Uma amostra da música que não sai da cabeça:


E eu nem vou comentar de supostos shows dela esse ano porque isso é doloroso demais pra pessoas que moram em cidades excluidas geograficamente.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Masculinidade ferida

Aconteceu da seguinte forma: eis que eu me dirigia a um clube localizado próximo a minha casa (leia-se: do lado) para pedir umas informações a cerca de exercícios físicos (em outras palavras, qualquer coisa que me fizesse sair dessa vida sedentária que se alastra por mais de seis meses) quando, de repente, uma moça me para e diz: "Oi, tudo bem?".

"Uau", pensei, "devo estar particularmente gatíssimo hoje, com essa calça de moleton e cabelos despenteados, para ser abordado, assim, por moçoilas total random na rua". Mãããããããss.....não! Ela não queria me convidar para um noite de sexo sel-va-gem, como eu estava imaginando. Pelo contrário, na verdade ela queria que eu ajudasse uma outra moça que, sabe-se Deus por quanto tempo, tentava de todas as formas possíveis trocar o pneu do carro.

Fiz toda a linguagem corporal macho-alfa possível: estufei o peito, levantei os ombros e coloquei a máscara mecânico-saca-tudo-de-carro-ok. Detalhe importantíssimo: nunca troquei um pneu na minha vida. Serião! Em quase seis anos dirigindo, jamais fui agraciado pela sorte do destino e pelas forças cósmicas-religiosas que regem o caos do trânsito de Boiânia com um pneu furado. Fazer o que? Eu não podia simplesmente negar a ajuda a não apenas uma, mas duas moças indefesas e ir embora.

Fui lá. O grande problema, ao que tudo indicava (olha o especialista), eram os parafusos. Eles simplesmente se recusavam a desenroscar da roda. Fiz de tudo. Empurrei com o troço lá que eu esqueci o nome (mentira, nem sei...veja o nível do profissional) pra todos os lados, com o pé, usei o peso do meu (finíssimo) corpo...e as porcarias não se moveram um centímetro. Estava quase usando a força da minha mente quando, do nada, aparece um outro cara pra ajudar as moças e, claro, o imprestável daquele cara que, obviamente, não estava conseguindo trocar um mísero pneu.

E o moço tomou conta da situação como um verdadeiro PHD em borracharia. Nunca vi tamanha destreza. Mas, a excepcional habilidade não parecia ser o suficiente para aqueles parafusos. Sentindo cada vez mais que a minha presença ali era um tanto quanto dispensável, avisei à moça que eu "só iria ali rapidinho pedir umas insformações, mas que já voltava". Isso porque posso ser inútil, mas tenho que manter a pose, óbvio.

Sentindo pena de mim mesmo, e sem interrupções, cheguei, finalmente, ao clube e fiquei lá um tempinho pedindo as informações que eu queria. Na volta, as moças ainda estavam lá junto com o doutor em mecânica e mais um outro cara! A roda defeituosa estava no chão e o rapaz misterioso estava terminando de colocar o último parafuso. Situação sob controle. Perguntei pra moça se ela precisava de alguma coisa (como eu sou prestativo, veja só) e fui-me embora com a sensação de dever masculino cumprido...not!

Enfim...conclusão de tudo isso: além de uma vergonha social, agora sou uma vergonha matrimonial. Eu estou fadado a ser o amante para o resto da minha vida. Eu não posso casar. Não sei trocar lâmpadas, não sei consertar o chuveiro, não sei pendurar quadros, não sei trocar pneus e nunca vou ter dinheiro.
Carreira eclesiástica, de repente, parece promissora.



quarta-feira, 3 de março de 2010

Um Olhar do Paraíso

Peter Jackson fez dois impossíveis (se é que tal expressão existe). O primeiro foi fazer quase o impensável: pegar a trilogia Senhor de Anéis e não apenas adaptar para o cinema, mas ainda assim transformar os filmes em marcos da indústria cinematográfica. Tarefa das mais difíceis. Se você já leu algum dos livros, sabe muito bem da complexidade do enredo e da riqueza dos detalhes. E, por incrível que pareça, apesar das mudanças, tudo está ali nos filmes de alguma forma.

Então, quando o diretor neozelandês anunciou que iria adaptar outro livro, The Lovely Bones, as expectativas de todos os mortais cinéfilos foram, obviamente, lá para as alturas (ainda mais pelo fato de que o enredo também flertava com a fantasia). Foi aí que Peter Jackson fez o segundo impossível: fez um filme bem mais ou menos.

Tendo como protagonista uma garota estuprada e assassinada, que narra diretamente do Paraíso como a sua família e amigos lidam com sua morte, o filme é carregado naquilo que o livro justamente quase não tem: fantasia. E o que mais falta ao longa de Jackson é justamente o que faz o livro da americana Alice Sebold ser incrível: uma dramaticidade das mais sinceras.


Juro por Deus, quando eu estava lendo o livro, em algumas partes eu tinha que dar uma parada porque as coisas estavam ficando tristes demais. Sebold descreve os personagens e as situações de forma tão verossímel, sem apelar ao melodrama, que é impossível não se envolver com os relatos do além de Susie Salmon.

Enquanto que no filme é tudo muito mal aproveitado. Personagens não se desenvolvem direito, subtramas se amontoam e a sensação é a de que o filme não tem um propósito definido. O grande problema foi o Céu do Jackson. Obviamente que uma cabeça imaginativa e inquieta como a do diretor não iria se satisfazer com o Céu simples descrito no livro. Mas, era dessa simplicidade que vinha toda a força dramática. Susie Salmon do livro via a sua família e amigos crescendo, vivendo as suas vidas, se apaixonando, mudando, etc. de cima de um Paraíso solitário e sem graça (era um high school americano sem ninguém, além da amiga). Você sentia a inquietação dela por não aceitar a morte e, mais por importante, porque ela queria tanto voltar.

No filme, o Paraíso mais parece um exercício de imaginação de Peter Jackson. E o mais estranho de tudo: era afetado pelos os que os vivos vivam (dããã! Sou gênio com as palavras, fala sério). Mas, claro! As imagens são simplesmente maravilhosas e provam o talento do cara.

Entretanto, para uma experiência mais completa de The Lovely Bones eu mais do que recomendo o livro. E fico na torcida para que o próximo projeto menos ambicioso de Peter Jackson se aproxime mais de Almas Gêmeas do que qualquer outra coisa.
(Que?! Nunca ouviu falar de Almas Gêmeas? Faça um favor a seu futuro cinematográfico e assista nesse mesmo instante esse filme!)