quinta-feira, 1 de abril de 2010

Traumas de Futebol

Momentos que definem sua vida: é uma partida de futebol sem compromisso entre amigos e conhecidos. Você, como todo garoto de onze anos, classe média, obviamente se interessa pelo esporte e arrisca umas jogadas, de vez em quando. No calor da disputa entre os dois times de pré-adolescentes, te passam a bola, e num momento mágico que nunca mais acontecerá, você dribla o goleiro e se vê cara-a-cara com o gol vazio. É agora, o primeiro momento de glória da sua vida, que será seguido de muitos outros, você tem certeza. É tudo fácil nessa vida, você pensa. Mesmo jovem, você percebe que tudo o que você precisa é de um pouco de sorte e sempre estar alerta. O resto é fácil. Tão fácil, que você chuta a bola...e ela vai pra fora. Gol perdido, indignação dos seus companheiros de time. E é hora de mudar.

Foi depois desse episódio....errr...digamos quase traumático...é que fui me atinar que talvez futebol não fosse tanto a minha praia. Decidi que eu iria tentar outras coisas. E foi no volêi que me achei. Quase uma saída do armário, minha gente. Fiquei tão feliz nesse novo esporte que até parei de me enganar achando que eu realmente tivesse algum interesse em torcer pro São Paulo. E bola pra frente.

Claro que o "não gostar de futebol" ainda gera situações um tanto constrangedoras. Estranhos tentando puxar assunto comentando o resultado do último clássico da rodada, e a sua resposta sendo uma cara de paisagem. O que você vai dizer? Que, sim, existem pessoas que podem não gostar de futebol, por mais que soe estranho? Começar o discurso que poderia ser ainda pior? Que além de futebol, você poderia não gostar de filmes, por exemplo? Ou, imagina!, dos Beattles?
Sim, pessoas podem ter preferências um tanto exóticas, mas ao que me parece, tolerância é algo meio difícil encontrar.

Eu perdi a conta de quantas vezes eu ouvi de estrangeiros, na minha passagem pela Nova Zelândia, que eu não poderia ser brasileiro. Pois, claro, eu obrigatoriamente tinha que ser fanático por futebol, e saber fazer embaixadinhas com muita destreza. Da mesma forma que todos os colombianos ali eram filhos de traficantes, que os alemães só gostavam de salsicha, que os árabes tinham bombas escondidas nas homestays e que os asiáticos tinham pinto pequeno. Pensa se eu ainda tivesse falado que eu não sabia sambar?

Claro que minha birra com futebol, com o passar do tempo, foi se desviando da pura falta de habilidade para algo mais complexo. Não me entra na cabeça, por exemplo, o fato de pessoas se matarem em estádios de futebol (e fora deles, também) pelo simples fato de serem de torcidas adversárias (que quase empata com por quê o poder público não acaba com essas torcidas organizadas). Me revolta o fato de que todos os envolvidos com futebol sairem lucrando, menos o pobre do torcedor (que dá dinheiro pro time do coração? what the fuck?!). Me revolta mais ainda futebol ser assunto levado mais a sério do que coisas urgentes. Só pra se ter uma idéia, Goiânia se candidatou a ser uma das sub-sedes da Copa do Mundo. Para tal, criou-se todo um projeto de melhoria do transporte público e do trânsito da cidade...que NÃO será implatado porque a cidade perdeu. Pra ser palco de jogo de futebol, tudo bem, mas porque é necessidade da população, que se foda, claro. Finalmente, me entristece ver campeões olímpicos, como César Cielo, mendigando patrocínio em programas de TV, e saber que futebol, com seus jogadores milionários, nunca ter trazido uma medalha para o Brasil.

Me pego pensando, às vezes, que minha vida poderia ter sido diferente se eu tivesse marcado aquele gol. Eu poderia ter continuado gostando de futebol. Eu poderia estar vestindo a camisa do São Paulo agora e ter a bandeira pendurada na parede do meu quarto. Eu poderia ter tido mais amigos e conhecidos. E até mesmo tido uma vida menos sedentária. Mas, o fato é que se isso tudo tivesse acontecido, eu poderia não gostar de nada do que eu gosto hoje. Sem filmes, música boa, escrever...engraçado pensar como marcar um gol pode mudar uma vida inteira.


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